Discos el Cabong

Monday, July 18, 2005

tara_code - "Azul e Roxo"



Se o modo neoliberal de ver o mundo comandasse sozinho os rumos da música, artistas como a banda baiana tara_code [assim mesmo, com caixa baixa e underline] não existiriam. Se a música fosse guiada apenas pelas regras comerciais do mercado, “Azul e Roxo”, disco de estréia do grupo, nunca seria lançado. Se existisse apenas um mesmo modo de se fazer música, a arte de compor e tocar não sairia do lugar e ouviríamos sempre a mesma coisa.

Este é um daqueles discos que necessitam de dedicação. Não porque seja difícil, mas não dá para ouvir “Azul e Roxo” sem prestar atenção a cada detalhe, sem apreciar com cuidado a sintonia entre a interface eletrônica, efeitos de guitarra e a poética urbana. Um trabalho delicado de produção e repleto de criatividade a cada momento.

A dupla Gilberto Monte e Andréa May conseguiu um excelente resultado do que eles vêm desenvolvendo há sete anos. No álbum, aparecem músicas dos diversos momentos do grupo, resumindo a trajetória e as diversas influências absorvidas por eles neste tempo. Estão lá o rock’roll, o trip hop, a pesquisa com ritmos, a mistura de timbres e a vivência com o mundo da eletrônica.

São dez faixas, algumas delas criadas há alguns anos, outras com a ambiência sonora do que o grupo faz hoje. A produção caprichada, desde a gravação até a parte gráfica, traz como conseqüência um álbum de alto nível e desde já um dos melhores discos nacionais do ano. [lm]



A dupla Gilberto Monte e Andréa May é ousadia, experimentalismo e arte. Sim, música ainda é arte, apesar dos pesares. Um belo trabalho, que prima pela criatividade e por uma sonoridade característica de quem não de importa em agradar a donos de gravadoras ou programadores de rádios.

Hermética? De forma alguma. A música produzida pela dupla é até acessível, mas é preciso estar aberto a ouvir algo fora do padrão. Definir a banda não é fácil.


“A gente tem esse dilema, a partir de uma longa trajetória, há um acúmulo de influências. Nosso trabalho é mais para o experimental, a partir de que não fazemos uma coisa convencional. A célula principal é o rock com a eletrônica; nesses dois, conseguimos um equilíbrio”, afirma May, que canta quase recitando as letras.

Andréa e Gilberto, o responsável pelas guitarras e bases eletrônicas, são acompanhados de uma banda

Thursday, June 09, 2005

Parafusa - “Meio-dia na Rua da Harmonia”


Basta, hoje, uma banda brasileira surgir cantando, em português, temas mais sensíveis, ter um extremo cuidado com arranjos, harmonias e letras, escapar do padrão rock adolescente e injetar algo mais, especialmente influências de música brasileira, que logo é acusada de copiar o Los Hermanos. Mas não é bem assim, sempre isso acontece quando uma banda nada contra a corrente, faz muito sucesso e transforma as influências comuns de uma geração em uma música própria. Quem aparece depois paga o preço.
A banda pernambucana Parafusa pode se passar, para os menos atentos, como fruto do trabalho dos barbudos cariocas, mas não é exatamente isso. Com um trabalho sincero, bem feito, criativo e com personalidade, os recifenses estão lançando seu primeiro disco, “Meio-dia na Rua da Harmonia”. Talvez brincando com o ditado, eles realmente colocam a harmonia no lugar da amargura. E não é só a harmonia musical, mas também alcançam uma harmonia das diversas influências que aparecem no disco. Uma combinação bem sucedida de elementos diferentes, que relacionados produzem uma sonoridade particular, mesmo que não tão eficiente em todos os momentos do trabalho.
Mas, se colocam de lado a amargura, sustentam um clima melancólico, falando da perda de amores ou da vida urbana, através histórias banais de personagens comuns. Histórias que podem ser de qualquer morador das ruas do Recife ou de qualquer cidade. Como em “Parece um Filme”, que conta a dura vida de um tal de Zé, ou em “No Asfalto” que fala de uma tal de Maria, figura comum que é atropelada e morre no asfalto numa terça-feira de sol.
Trazendo influências comuns de bandas contemporâneas, a Parafusa vai além e inclui elementos pouco usuais. A base do som da banda é rock, indo de Beatles a progressivo, com alta dose pop, clima circense e muita influência da boa música brasileira, um pouco de samba ali, música nordestina acolá. No molho aparece também um pouco de frevo, ritmo tipicamente pernambucano, que nem o Mangue Beat soube valorizar. A banda aproveita e bem. Acabam meio que modernizando marchinhas de frevo, como em “Longa Canção sobre um Grande Amor”.
E o Carnaval aparece também nas letras, mantendo o clima melancólico do fim da festa (outra semelhança com o Los Hermanos). Como em “Última Troça” que diz “Foi, carnaval se foi/ Me levou você/ Carregou consigo/ Foi, mas o que ele fez?/ Me deixou aqui só com os meus sentidos/ E se foi, e se foi”. Ou em “Marchinha”, que fala “É carnaval, todos fazem barulho/ Eu gostaria de poder cantar/ E lhe encontrar, lhe abraçar/ É você na fantasia?/ Esta cidade parece um poema/ Em qual esquina você pode estar?/ Atrás da orquestra?/ Nesse cordão?/ Sentada em alguma janela?/ Pulando no meio da multidão?/ Toda alegria no ar/ Espero e hei de encontrar você/ No carnaval”.
Além do básico, guitarra, baixo e bateria, o grupo utiliza outros instrumentos menos usuais numa banda de rock para construir sua musicalidade particular. Estão lá teclados, mas também escaletas, percussão e piano, dando um clima próprio. “Meio-dia na Rua da Harmonia” ajuda a comprovar o bom momento criativo da música brasileira, apesar de distante das rádios e da grande mídia. Uma pena.

Belasco – “Alexei”


O noise de guitarras, as belas melodias e as letras em inglês marcam o indie rock brasileiro. O power trio de Fortaleza Belasco é um dos frutos desta vertente dos herdeiros do pós-punk, mas ao invés de optar pelos já tradicionais muros de guitarras, a banda prefere adentrar o universo das canções. “Alexei” reúne em pouco mais de 26 minutos um apunhado delas, que além do indie rock, traz ecos de folk e garage rock. São 10 músicas que conquistam fácil os amantes das boas melodias, que em momentos remetem a Velvet Underground, REM e Neil Young. Destaque para o trabalho de guitarra, com belos timbres tirados por Fábio Rodrigues de seu equipamento acústico e que aparecem limpos na maioria do disco. Há também bons momentos, onde a distorção ganha espaço. A combinação do trabalho melódico e os momentos mais ruidosos aparecem em músicas como “Alexei” e “Intermission”, que alternam momentos doces, dançantes e calmos com uma parede ruidosa e suja de guitarras. Destaque também para “Dry”, que traz uma admirável parte instrumental, com a guitarra chorando, combinado com uma das melodias vocais mais belas do disco. O vocal, também de Fábio Rodrigues (que decidiu abandonar a banda após a turnê que rodou vários estado do pais), reveza os tons graves com bem colocados falsetes em letras em inglês que falam de realidade e ilusão. A cozinha certeira e competente (com George Araújo na bateria e Oni Matos no baixo) dá sustentação às canções, guiando a banda tanto nos momentos mais calmos quanto nos mais sujos. Rock para se ouvir o tempo inteiro.

Sangria – “Sangria” (EP)

Raiva, desespero, dor e agonia. Poucas vezes essas sensações conseguem ser transmitidas com fidelidade. Seja no cinema, onde filmes apelam para o lugar-comum, não assustando nem criança e provocando riso, seja na música, com bandas que abusam de clichês e se tornam piada. Tal qual nos melhores filmes de horror e suspense, a banda Sangria, uma das boas revelações do ano em Salvador, cria um universo angustiante, sufocando o ouvinte com uma música pesada e densa e letras pessimistas que falam de um mundo abjeto, desprezível e sem futuro.

Se você está acostumado a ver bandas que usam o lado escuro da alma humana como marketing, assim como em filmes com os Jasons da vida, esqueça. O caso aqui é sério e pega na veia. Possuídos pelo capeta, soltando os demônios em formato de riffs poderosos de guitarra, um cozinha violenta e um vocal que representaria muito bem a sucursal do inferno na Terra, a Sangria faz um som desesperado e não recomendado para quem tem fobias. Pouca gente consegue transmitir angústia, raiva, dor e barulho de forma tão intensa, apocalíptica e detonadora.

Apesar de revelação, a Sangria tem entre seus integrantes alguns nomes importantes do rock alternativo baiano. Os ex-Dinky Dau Bola (guitarra) e Pedro Bó (baixo), o ex-Úteros em Fúria Apú (guitarra) e Mauro (vocal) formam a banda ao lado de um monstro na bateria, Emanuel. Todo o clima barra-pesada criado por eles ganha maior dimensão com o vocal de Mauro, que se entrega às letras e a atmosfera, num vocal esganiçado com sangue, raiva e desespero saindo pela boca.

A banda, formada n final de 2003, marca o retorno de Mauro à frente dos vocais depois de nove anos, desde o fim da Úteros. Além de ser o front-man, ele é também o responsável pelas letras que tratam de um mundo caótico e sem esperança. “Não combina a gente falar de coisas boas. Não dá para viver na Bahia e falar de amor e alegria. Que alegria? Eu não to vendo nada de bom. Não tenho fé na raça humana”, afirma Mauro. As referências não poderiam ser outras, poetas, escritores e gente barra pesada, junkies, gente que não tem fé na vida, Nietzsche, Soudgarden, Alice in Chains e Black Sabbath. Barulho barra pesada de alta qualidade.

Junio Barreto – “Junio Barreto”


Um pé no terreiro e o outro na tecnologia. Um olho no passado da MPB e outro no que vem se transformando na nova música brasileira. Assim é o disco de estréia do pernambucano residente em São Paulo, Junio Barreto. Muito se tem feito por ai colocando a música brasileira namorando a música eletrônica. Aqui, no entanto, a eletrônica trabalha a serviço das canções, das melodias e da poética de Junio, que acompanhado de um excelente time de músicos, produz um daqueles álbuns para ir absorvendo aos poucos, até ele dominar os sensores sensíveis do corpo. Um disco que coloca o autor entre os principias novos nomes da música feita no Brasil.
Logo de início, em “Qual é Mago”, Junio solta: “Tá com saudade da praia, né nego?”. Um sambinha que dá uma pista da inspiração do autor: os ares de sua terra deixada para trás, que aparece também na capa do disco, em referências a ícones e lembranças nordestinas, como a bandeira do Central de Caruaru e o clima de interior. A referências prosseguem nas poéticas letras, sem soar como um mero neo-cordelista, mas com um toque contemporâneo de quem vive numa metrópole.
Com muita sensibilidade e capacidade de articular palavras e imagens, Junio cria uma linguagem particular nas letras. "Ontem acordei de susto / do ronco da minha barriga com fome/ Bem quando sonhava / que estava jantando / com alguns amigos bons/ Salada e camurim, cajuada aromática/ Jenipapada e alguns amigos bons", em “Amigos Bons” ou “Ela mandou caiá/ lavar todo o terreiro/ Quis dengo de mão e samba de maracatu/ Deu rosa pa menino/ Buchada de carneiro, ê/ Só porque chegou água na torneira”, em “Oiê”, ou ainda “Raiou mais bela Flô raiou/ Num caísse de leva que seja/ Indo o céu abrir de sol/. E agora a chuvinha que cai de voada maneira/ Molha, molha o chão”, em “Do Caipora ao Mar”.
Junio dá ênfase à percussão em boa parte do álbum, como num terreiro eletrônico, mas com as batidas de candomblé se misturando a loops, samples e batidas digitais. Um passeio pela riqueza da música brasileira, com ecos de bossa-nova, melancolia, samba, Dorival Caymmi e as belas e sensíveis letras. Tudo isso sem soar retrô, muito menos soando como um vassalo dos intocáveis, ou mero refazedor do que já foi feito. Sem soar vazio em querer inventar um futuro inédito.
Como poucas vezes se viu tão bem misturado, o disco reúne nas mesmas músicas moogs, ganzás, tamborins, palmas, harpas, sampler, flautas, congas, vibrafones, pianos, tipos diversos de teclados, violões de 7 cordas, programação eletrônica. O resultado é uma música sofisticada que não soa pretensamente vanguardista, mas que, ao mesmo tempo, mostra um caminho inteligente e promissor para a música brasileira.

Wednesday, June 08, 2005

A Sangue Frio - “Sonetos do Asfalto”


Curtas, rápidas e certeiras. São assim as músicas da banda A Sangue Frio, uma das boas revelações do rock baiano em 2004. Eles acabam de lançar o primeiro CD (já tinham um EP lançado há seis meses), “Sonetos do Asfalto”, uma pancada sonora rapidíssima de apenas 21 minutos e trinta e dois segundos. A banda acerta no alvo nas curtíssimas doze músicas, que variam entre um e dois minutos de duração. Uma pancadaria sensível e não-gratuita, que não segue a linha hardcore tradicional do selo Estopim, responsável pelo lançamento. Fazem um som que vem sendo chamado de pós-hardcore, com peso e guitarras altas e diretas, mas com uma grande preocupação com as melodias. As influências vêm de bandas do inicio da década de oitenta de Washington DC, como Embrace, Dag Nasty e Rites of Pring, que desaceleraram um pouco o hardcore, colocando guitarras oitavadas e com letras um pouco mais pessoais. Acabaram criando o movimento EMO, bastante diferente de como é conhecido o gênero atualmente.

A Sangue Frio está mais para o som dessas bandas oitentistas do que para o que chamam hoje de Emo, apesar de também falarem de relacionamentos amorosos em suas letras. Mas vão além, com letras curtas e diretas colocam indagações e posições políticas, focadas em críticas à apatia e ao sistema, sem soar panfletário. Como em “Resignado”: “A luta se mostrou cansativa e intensa para a sua pouca força de vontade. Sua máscara logo caiu e por isso resolveu escolher o caminho mais curto, se resignar e “crescer”. Sei que tinham coisas mais importantes a fazer, trabalho, estudos, ilusão e resignação”. Interessante são os vocais de Fabiano Passos, que faz quase que simultaneamente um vocal principal melódico e gritos agudos e estridentes nos backings. É talvez a banda meio termo entre o hardcore e os sons mais indies e pop de Salvador, podendo agradar os dois lados. Grande e boa novidade do cenário local.

Djunks – “Quando tudo parecia tão ruim”


A Bahia já tem seu CPM22. Djunks é o nome da banda, que segue os passos do emo-core tão na moda no país. Estão lá todos os clichês. O vocal sem graça e sem alma, que é uma das marcas mais presentes no estilo. As letras, falando quase em 100% das vezes de desilusões amorosas, sem muita inspiração. O peso, na verdade, peso mosca, que é um disfarce, já que é o tipo de som (com aqueles riffs de sempre) para adolescente que ainda não aprendeu do que o trio guitarra-baixo-bateria é capaz. Os meninos (não passam de 23 anos) tocam bem, mas precisam ampliar as referências. O resultado mostra, no entanto, que a Bahia já tem um bom representante no emo-core, não devendo para nenhuma outra do estilo no país. Só não sei qual a relevância e importância disso. Evidente, que um disco deste gravado aqui mesmo em Salvador, com profissionais locais, mostra a capacidade de se produzir um trabalho de alto nível técnico, da capa e material gráfico (muito bons) até a gravação. A produção, a cargo de Luisão Pereira (ex-Penélope) merece destaque. Os fãs do gênero podem comprar de olhos vendados, com certeza vão gostar. Já quem não gosta pode permanecer à distância.

Tuesday, June 07, 2005

Narguilé Hidromecânico – "Com Gosto de Gás"


Vinda do Piauí, a Narguilé Hidromecânico faz uma mistura bem azeitada de rock, ritmos do nordeste, reggae e muita percussão, mas que chega no limite entre um trabalho interessante e a música mais comercial com pouca ousadia. Em alguns momentos a banda se perde tentando inserir elementos pop quase clichês, desde timbres óbvios até misturas pausterizadas, como se precisassem disso para atingir um público maior. Mas a junção de peso com sotaque nordestino, os passeios pelo reggae e um meio funk têm bons momentos. Destaque para os reggaes "Novo Mundo" e "Pode Ser", a carnavalesca frevo-rock "Frevo Lição" e os bem feitos mistos de rock e sons nordestinos que remetem às misturas feitas em Pernambuco, como em "Bilãozinho Astral", "Cabaça Dela" (com sua letra sensual dúbia), "Redondilha" e "Só Vou Mudar". Guitarras distorcidas, zabumba, pandeiro, berimbau, caxixis, triângulo, fole, efeitos eletrônicos, pick ups, sintetizadores, histórias e termos nordestinos nas letras criam uma música sintonizada com as produções recentes feitas na região.